quinta-feira, 4 de maio de 2017

PASSOS NO CAMINHO


"O curso normal da evolução humana leva o homem para o alto, estágio por estágio. Entretanto, uma distância imensa separa até os gênios e os santos do homem que 'está no limiar da divindade' – e ainda mais daquele que cumpriu a ordem de Cristo: 'Sede perfeitos, como Vosso Pai do Céu é perfeito.' Há alguns passos que levam à subida para a Passagem, da qual está escrito: 'Estreita é a porta e árduo o caminho que leva à vida, e poucos são os que o encontram.' Quem são 'os perfeitos', dos quais fala Paulo, o Apóstolo?

Na verdade, há passos que levam a esse Portal, e poucos são os que palmilham o seu caminho árduo. A Porta é a da Iniciação, o segundo nascimento, o batismo do Espírito Santo e do Fogo, o Caminho que leva ao conhecimento de Deus, que é a Vida do Eterno.

No mundo ocidental, os estágios, ou passos, foram chamados de Purgação, Iluminação, União; por esses estágios, o Místico – o que é levado à visão Beatífica pela devoção – designa o Caminho. No mundo oriental, o Ocultista – o Conhecedor ou Gnóstico – vê os passos de uma forma um tanto diferente, e divide o caminho em dois grandes estágios: o Probatório e o Caminho propriamente dito; o Probatório representa a Purgação do Místico, enquanto o Caminho propriamente dito é a Iluminação do Místico. Ele procura, ainda, desenvolver em si próprio, quando no Caminho Probatório, certas 'qualificações' definidas, preparando-se para passar através do Portal que marca o fim do Caminho, enquanto no Caminho propriamente dito ele deve descartar por inteiro dez 'grilhões' que o impedem de atingir a Libertação ou Salvação Final. E terá de passar através de quatro Portais ou Iniciações.

Cada uma das qualificações deve ser desenvolvida até certo ponto, embora não completamente, antes que o primeiro Portal possa ser cruzado. São os seguintes, esses Portais:

• Discernimento: o poder de distinguir entre o real e o irreal, entre o eterno e o transitório – a visão aguda que vê o que é Verdadeiro e reconhece o que é Falso sob todos os disfarces. 
• Imparcialidade ou Ausência de Desejo: estar acima do desejo de possuir objetos que dão prazer ou afastar objetos que causam dor, pelo domínio absoluto da natureza inferior e pela transcendência da personalidade. 
• Os Seis Dons ou Boa Conduta: controle da mente, controle do corpo – em palavras e em ações –, tolerância, resignação ou boa disposição, equilíbrio ou determinação, confiança. 
• Desejo de União ou Amor: essas são as qualificações cujo desenvolvimento é a preparação para o primeiro Portal da Iniciação. Para obtê-las, o homem reveste-se de resolução, firma a mente na ideia de caminhar para a frente com rapidez, de forma a poder tornar-se um Auxiliar da Humanidade.

Logo que tiver adquirido o suficiente dessas qualificações para bater à Porta e vê-la aberta, ele está pronto a atravessar o limiar e a palmilhar o Caminho. Então ele é iniciado ou recebe o 'segundo nascimento'. Entre os hindus, ele é chamado de o Viandante (Parivrajaka ou Sotapanna) e, antes de chegar à segunda Iniciação, deve descartar por inteiro os obstáculos da: Separatividade – deve compreender que todas as personalidades são uma; da Dúvida – deve saber e não apenas acreditar nas grandes virtudes do Karma, da Reencarnação e da Perfeição a serem alcançadas palmilhando o Caminho; da Superstição – a dependência de ritos e cerimônias. Descartados por inteiro esses três grilhões, o Iniciado está pronto para o segundo Portal e torna-se o Construtor (Kutichaka), ou 'o que retorna apenas uma vez' (Sakadagamim). Ele deve agora desenvolver os poderes dos corpos sutis, para ser útil nos três mundos, para estar preparado para o serviço. A passagem pelo terceiro Portal faz dele o Unido (Hamsa, 'Eu sou Ele') ou 'aquele que não retorna', a não ser com seu próprio consentimento (Anagamim). Para o quarto Portal ele deveria passar nessa mesma vida, e, para aquele que passou, o nascimento compulsório está terminado. Agora ele deve descartar os grilhões do Desejo – os desejos rarefeitos que talvez tenham ficado nele – e da Repulsa – nada deve ser repulsivo para ele, porque em tudo ele deve ver a Unidade. Isso feito, ele passa através do quarto Portal, e torna-se o superindivíduo (Paramahamsa) ('além do eu') ou 'o Venerável' (Arhat). 

Cinco são os tênues grilhões que ainda o prendem; contudo, é tão árduo partir sua complexa sutileza que sete vidas ainda são usadas, com frequência, no caminhar pelo espaço que separa o Arhat do Mestre, do Livre, do Imortal. 'Aquele que nada mais tem a aprender' neste sistema, mas pode saber o que desejar voltando sua atenção para o que quer saber. 

Os grilhões são: o desejo da vida na forma, desejo pela vida em mundos sem formas, orgulho – pela grandeza da tarefa realizada, a possibilidade de ser perturbado pelo que quer que seja que aconteça, a ilusão – a última película que pode distorcer a Realidade. Quando tudo isso tiver sido descartado para sempre, então o triunfante Filho do Homem terá terminado o Seu curso humano, tornando-se 'uma Coluna no Templo do meu Deus e dali não mais sairá'. Ele é o homem que se fez perfeito, um dos Nascidos Primeiro, um Irmão mais Velho da nossa raça."

(Annie Besant - O Enigma da Vida - Ed. Pensamento)


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