"Que é o homem - Uma inteligência espiritual, uma porção da Divindade revestida de matéria. Diz o Bhagavad-Gîtâ: 'Uma porção de Meu próprio Ser se transforma, no mundo da vida, no Espírito Imortal, e atrai inteiramente a mente e os demais sentidos velados na matéria.' Tal é a sumária descrição do homem expressa no imortal Canto do Senhor. Demonstra que a natureza íntima do homem é um fragmento ou porção da Divindade, um Espírito imortal revestido de invólucros, de agregados de matéria, de corpos, ou como se queira chamar esta parte temporária e mutável, em contraste com sua eterna natureza dimanante do mesmo Deus.
Para compreendermos o que é o homem, devemos considerar a continuidade de sua vida, porque continuadamente está desenvolvendo sua Divindade íntima e modelando seus corpos mutáveis, de sorte que expressem sempre suas capacidades crescentes.
Na semente está potencialmente contida a árvore do futuro, e plantada na terra absorve do solo sua nutrição, ao passo que o sol, a chuva e o ar a nutrem, determinando pouco a pouco sua germinação, até que cheia de raízes, brota o talo e despontam as folhas, convertendo-se em rebentos que a cada estação vão crescendo e por fim alcançam a altura da árvore progenitora de onde procedeu a semente. No inverno caem as folhas e a árvore fica desnuda, para na primavera revestir-se de nova folhagem em sucessivas renovações, sem prejuísos e sim com grande proveito para a árvore. Tudo isto também ocorre com o homem, a divina semente plantada pela mão do Eterno na matriz da matéria, que desta absorve sua nutrição e se alimenta com o sol do júbilo, a chuva da tristeza e o ar do ambiente das circunstâncias. Em cada estação ou ciclo de vida, reveste-se de folhagem que lhe proporciona experiência e depois caem as folhas, enquanto a árvore vai crescendo até assemelhar-se ao seu pai e passar da humanidade à supra-humanidade, para viver em campos mais amplos, numa vida sempre crescente, mais plena, abundante e divina.
Portanto, que é o homem? Um fragmento divino; a Divindade latente em vias de atualização; a reiterada maravilha que o cristianismo simboliza no Deus feito homem, porque o filho do homem é verdadeiramente o Filho de Deus. O hinduísmo nos fala do sacrifício de Purusha, no Deus que se sacrifica para ser homem em benefício dos homens e do seu mundo. O processo desta atualização, os meios deste desenvolvimento, o segredo da evolução, chama-se transmigração se considerarmos o passo da inteligência espiritual de uma à outra forma, e chama-se palingenesia ou reencarnação se nos referirmos aos corpos mortais de que se reveste o espírito em cada ciclo ou período de vida."
Annie Besant - A Vida do Homem em Três Mundos
Ed. Pensamento, São Paulo - p. 12/14
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